sábado, setembro 30, 2006

Como é que pode?

"Quanto mais Jecas Tatus, mais fortes as mãos que levam cestas básicas. Por aqui começa a explicação para a recorrente e inquietante pergunta do momento: como é que pode um país conviver com tantos escândalos, com tanta podridão, com tantos achaques, com tanta leniência, e ainda se dar ao luxo de se considerar avançado e pleitear um lugar nos foros ocupados por nações do Primeiro Mundo? Como se explica o fato de o mandatário-mor, acossado mais uma vez por situações rocambolescas e abomináveis, perpetradas por assessores mais chegados, como a compra de dossiês para prejudicar adversários, continuar imune ao repertório de perfídias, conchavos, negociatas, fraudes e mentiras abrigadas em seu governo? Como o candidato à reeleição continua impávido quando a tempestade devasta pessoas que, até há bem pouco, privavam de sua intimidade? Como se explicam “grampos” colocados na sede de nossa maior Corte Eleitoral, no momento em que os magistrados se esforçam para promover um choque de moralidade nos costumes eleitorais? Chegamos à perfeição em matéria de paradoxo: grampear a Justiça.
Mas, no Brasil, isso é fichinha. Do vilão que se transforma em herói ao nome digno que se joga na cesta do lixo, a distinção é imperceptível. O olhar nacional se acostumou à escuridão. Como ensinava Adam Smith, uma vez que nossa visão sobre estética é influenciada por usos e costumes, não se pode esperar que percepções relativas à beleza de conduta estejam inteiramente isentas do domínio desses princípios. Quem enfrenta o infortúnio de ser criado no meio da violência, licenciosidade, falsidade e injustiça se acostuma a aceitar quem pratica tais monstruosidades. Familiarizadas desde a infância com os vícios, as pessoas se predispõem a considerá-los naturais, como se fossem o ‘jeito do mundo’, algo que pode e deve ser por elas praticado. Essa disfunção está por trás do estado de devassidão que toma conta do País. (Foto.)

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