domingo, fevereiro 27, 2011

Ficou fácil deixar o rei nu

Ficou fácil deixar o rei nu
Gilberto Dimenstein
Folha de S Paulo
São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 2011
Uma série de sites está revolucionando o conceito que se tem de transparência, a exemplo do WikiLeaks
Foto: Sarney

ALIMENTADA POR DEZENAS DE milhares de pessoas e atualizada diariamente na internet, uma espécie de Bolsa de Valores informa publicamente quanto custa a maconha na maioria das cidades norte-americanas. Chega-se ao requinte de informar o preço no mercado de acordo com a qualidade do produto: ruim, regular e bom.
O leitor pode imaginar que ouvi essa "dica" de algum estudante num dormitório ou cafeteria aqui em Harvard, mas a verdade é que a informação foi transmitida numa solene sala de aula, quando se mostrava a comunicadores como as novas tecnologias impactam a produção e a distribuição de conhecimento. Depois desse exemplo, apareceu na tela o que poderíamos chamar de "bolsa do crime": trata-se de um programa que permite que se saiba de forma simples e ricamente ilustrada quais foram os crimes, divididos em suas várias modalidades, que ocorreram em cidades dos Estados Unidos nas últimas 24 horas. Entre eles está a venda de drogas.

Neste momento, em que as revoltas no Oriente Médio são atribuídas, pelo menos em parte, às novas tecnologias, que estão produzindo uma geração de jovens informados e conectados, a "bolsa da maconha" serve curiosamente também para ilustrar como o cidadão consegue se informar e se mobilizar sem depender tanto dos meios tradicionais de comunicação.

Aplicativos que não custam quase nada ou, em certos casos, nada mesmo já permitem que sejam editados em poucos minutos no celular, durante o calor dos acontecimentos, programas de rádio (Poddio Audio Editing) ou de televisão (First Video). Quem está acostumado com as pesadas e caras máquinas dos estúdios de rádio e televisão sabe muito bem o que isso significa.
Quem rala para degravar uma entrevista de horas sabe o valor de um programa recém-lançado (Voice Base) que coloca no papel em tempo real o que foi gravado no celular. A entrevista degravada pode ir direto para o Facebook ou para o Twitter.
Não é necessário mais digitar no celular enquanto se está dirigindo para saber onde fica determinado restaurante ou loja, basta apenas falar para receber o mapa com a localização (Vlingo).

Disseminam-se mecanismos para checar informações que podem aguçar o poder crítico do indivíduo e ajudar no trabalho de apuração dos jornalistas.
Uma série de sites está revolucionando o conceito que se tem de transparência, a exemplo do WikiLeaks, responsável pela divulgação de documentos secretos que provocou grande impacto em vários países. Aliás, nesta semana saiu um livro que detona a credibilidade do WikiLeaks, escrito por um de seus altos funcionários.
Sites permitem fazer facilmente extraordinários cruzamentos.



Enquanto se acompanha uma votação parlamentar ou uma proposta apresentada por um governante, é possível ver na tela do computador os mais diferentes tipos de ligação e de interesse de cada político, quais são seus negócios, quem dá dinheiro para a sua campanha, com quem tem obras ou contratos -e até suas viagens ou os presentes que ganha, inclusive de nações estrangeiras.
Um programa criado recentemente (Poligrapf) extrai trechos de uma notícia e informa detalhes sobre as entidades envolvidas em determinados eventos. Com isso, a notícia pode ficar mais transparente para o leitor.

Pode-se pensar que, com tudo isso, o jornalista é uma espécie em extinção. Muito pelo contrário. Com tanta informação disponível em qualquer canto, cada vez será mais necessário haver gente treinada para distinguir o que é essencial do que é supérfluo. Se algum leitor tiver alguma dica, envie que eu incluo.

PS- Preparei uma seleção com todos os sites mencionados nesta coluna (www.catracalivre.com.br) para que leitor possa um fazer exercício de cidadania digital e deixar alguns reis nus.

gdimen@uol.com.br

Ocidente quer se livrar de Kadafi

Ocidente quer se livrar de Kadafi
Tribuna do Norte
Natal, Domingo, 27 de fevereiro
Paisley Dodds - Associated Press

Londres - Quando Muamar Kadafi (Foto ao lado) disse ao mundo que era um homem mudado, alguns líderes mundiais reagiram com ceticismo. Outros, como o britânico Tony Blair, foram mais rápidos em ver os benefícios da reaproximação com o país, rico em petróleo. Agora, em um momento no qual o regime de Kadafi parece ruir, são levantadas perguntas sobre se a Grã-Bretanha, os Estados Unidos e outros países não foram muito rápidos em acolher um déspota volúvel ligado a grupos extremistas e a atos opressivos ao buscarem lucrativos acordos comerciais.

Esses acordos, no valor de bilhões de dólares, estão agora em risco na medida em que a Líbia se dirige para uma guerra civil. A decisão estratégica de construir ligações com líderes como Kadafi, o egípcio Hosni Mubarak e o tunisiano Ben Ali também ameaçam inflamar o sentimento contra o Ocidente no mundo árabe.

O papel de Blair foi particularmente vital na reabilitação internacional de Kadafi. O ex-primeiro-ministro britânico viajou para a Líbia em 2004 e conversou com Kadafi no interior de uma tenda beduína. Ele elogiou o encerramento dos programas de armas nucleares e químicas da Líbia e destacou a necessidade de novas alianças após os ataques de 11 de setembro de 2001 contra os Estados Unidos. Os acordos comerciais com a Grã-Bretanha começaram logo depois.

A Grã-Bretanha vendeu cerca de 40 milhões de libras (US$ 55 milhões) em equipamentos militares no ano encerrado em 30 de setembro de 2010, segundo estatísticas do Ministério de Relações Exteriores britânico. Dentre os itens vendidos estão fuzis de precisão, veículos a prova de balas, munição para contenção de multidões e gás lacrimogêneo. “O que o Ministério de Relações Exteriores pensou que o coronel Kadafi faria com fuzis de precisão e granadas de gás lacrimogêneo? Caças toupeiras?”, questionou o jornal britânico The Guardian.

Embora o atual governo britânico, liderado por David Cameron, tenha revogado dezenas de licenças de exportação para a Líbia após os episódios de violência no país, muitos dizem que os mesmos equipamentos e armas que a Grã-Bretanha vendeu para a Líbia estão sendo usados contra o povo do país.

O Serviço Especial Aéreo (SAS, pela sigla em inglês) da Grã-Bretanha também participou de recentes treinamentos para soldados líbios nos setores de contraterrorismo e vigilância. Robin Horsfall, ex-soldado da SAS, disse na época que o treinamento foi um erro. “Pessoas vão morrer como resultado desta decisão”, advertiu ele.

Desde que a Escócia libertou Abdel Baset al-Megrahi - o único condenado pelo ataque a bomba contra o avião que fazia o voo 130 da Pan Am, que explodiu sobre a cidade de Lockerbie, Escócia -, legisladores norte-americanos têm acusado a Grã-Bretanha de apoiar a libertação do líbio em troca de acordo com petróleo.

Jogo empresarial leva EUA a calar sobre relatórios

Em 2008, o ex-presidente George W. Bush enviou sua principal diplomata, Condoleezza Rice, para a Líbia para conversar com Kadafi. Ela disse que a viagem era “histórica” e afirmou que teve de “superar muita dificuldade, o sofrimento de muitas pessoas que nunca serão esquecidas ou acalmadas”. No mesmo ano, a texana Exxon Mobil assinou um acordo de exploração com a Corporação Nacional de Petróleo da Líbia para explorar hidrocarbonetos na costa do país norte-africano.

A alta comissária da Organização das Nações Unidas para os direitos humanos, Navi Pillay, lembra que líderes norte-americanos a desencorajaram a pressionar a Líbia por causa dos relatórios ruins sobre direitos humanos. “Nos últimos dias (do governo Bush) eu me encontrei com alguns representantes da administração norte-americana”, contou Pillay em entrevista à Associated Press. “Eles disseram que os relatórios da Líbia estavam bem e que não precisaríamos entrar neste assunto.”

Muitos na comunidade de inteligência disseram, na época, que viam a suposta transformação de Kadafi com otimismo cauteloso. “Ele dizia que queria combater o extremismo, o que encaramos mais positivamente do que os norte-americanos”, disse Ilan Mizrahi, que já foi o número dois no comando da agência de inteligência israelense, o Mossad. “Mas também dissemos para serem cautelosos com esses momentos de sanidade.”

Poucos líderes europeus escaparam da ira de editoriais de jornal ou de embaraçosas montagens com fotografias com o excêntrico líder. Os ex-primeiros-ministros britânicos Blair e Gordon Brown, o presidente francês Nicolas Sarkozy, o então chanceler alemão Gerhard Schroeder e o primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi estão entre eles. O encontro do Ocidente com Kadafi e outros já irritou alguns manifestantes, que sentiram que as grandes potências mantiveram os opressores no poder e os enriqueceram, enquanto enganavam as pessoas comuns sobre as riquezas que as petrolíferas estrangeiras receberam.

Para a Alemanha, a visita de 2004 de Schroeder ocorreu depois de um acordo da Líbia para pagar indenização para as vítimas de um ataque a bomba em 1986 contra uma discoteca, em Berlim Ocidental. A França também cortejou Kadafi em 2007. Mas para a Grã-Bretanha a revolta na Líbia tem sido ainda mais embaraçosa. Kadafi foi fornecedor do Exército Republicano Irlandês e seguidamente ligado ao ataque em Lockerbie, embora nunca tenham surgido provas para as acusações. Ainda assim, quando o homem responsabilizado pelo ataque foi libertado em 2009 por razões humanitárias, por padecer de um câncer em estado terminal, Kadafi e seu filho fizeram uma extravagante festa de boas-vindas em sua casa.

População se revolta e prefeito foge da cidade

População se revolta
e prefeito foge da cidade

Tribuna do Norte
Natal (RN), 27 de Fevereiro de 2011

Salvador (AE) - Uma onda de protestos contra a violência em Valença, cidade litorânea a 255 quilômetros ao sul de Salvador, levou o prefeito da cidade, Ramiro Campelo de Queiroz (PR, na Foto), a fugir e procurar abrigo na capital baiana. As manifestações começaram na tarde de quinta-feira (24), na frente da Câmara Municipal. O estopim foi a demora para a liberação para sepultamento do corpo de um jovem de 25 anos que havia sido assassinado dentro de casa, durante um assalto, na noite anterior.

Revoltada, a população passou a cobrar das autoridades mais segurança e a contratação de médicos-legistas. Em seguida, manifestantes atearam fogo em pneus nas ruas centrais, quebraram vidros e portas de lojas, da câmara e da prefeitura, além de fazer saques em pelo menos dez estabelecimentos comerciais - alguns deles de propriedade da família do prefeito, que tem uma concessionária de veículos e uma rede de lojas de móveis e eletrodomésticos.

Temendo sofrer ataques em casa - um imóvel térreo de muros baixos -, Queiroz pediu escolta policial e deixou a cidade junto com a família, rumo a Salvador, pelo ferryboat. Segundo a delegada Glória Isabel Santos Ramos, da 5ª Coordenadoria Regional da Polícia Civil (Coorpin), responsável por Valença, as manifestações foram contidas ainda na noite de quinta-feira (24). Três pessoas foram detidas em flagrante, por furto. Os objetos, segundo a polícia, foram recuperados.

Valença registra índice de homicídios semelhante ao de Salvador, em torno de 60 casos para cada grupo de 100 mil habitantes, e as notificações têm mantido ritmo crescente. Em janeiro, foram 11 assassinatos, ante sete no mesmo período do ano passado.

Segundo o Mapa da Violência 2011, a Bahia foi o segundo Estado onde o número de homicídios mais avançou no País entre 1998 e 2008, com aumento de 237,5%, atrás apenas do Maranhão (297%). No período, o Estado saltou da 22ª posição entre os mais violentos, para a oitava posição.

Povo paga R$ 1,1 milhão por ano por cada deputado

Cada deputado estadual
custa R$ 1,1 milhão por ano
Tribuna do Norte
Natal (RN), 27 de Fevereiro de 2011
Maria da Guia Dantas - repórter

Ilustração:
Deputado Ezequiel Ferreira de Souza (ao lado)
Cada um dos 24 deputados estaduais na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte custa aos cofres públicos do Estado cerca de R$ 1.157 milhão ao ano. Um pouco mais ou um pouco menos. A imprecisão deve-se as dificuldades enfrentadas pela reportagem – o Ministério Público também procura saber os números – em levantar os valores com salários pessoais, verbas indenizatórias, ajudas de custos e gratificações de gabinetes que, de forma direta e/ou indireta, podem compor os custos de manutenção de um deputado.

O valor citado é a soma anual dos salários mensais de R$ 20.043,68 (veja abaixo), do limite das 12 parcelas de R$ 24.057,90 correspondentes à verba indenizatória e aos R$ 43.708,20 (salários e 13º) destinados ao pagamento dos nove cargos comissionados à disposição de cada gabinete. Assim como na maioria dos Legislativos do país, os parlamentares potiguares têm direito a quinze salários ao ano, incluindo o décimo terceiro. As duas remunerações a mais correspondem às ajudas de custo anual, recebidas no início e no fim de cada legislatura com valores correspondente ao valor do subsídio mensal.

Contabilizando-se valores das fontes de despesas citadas (salários, verbas e cargos) chega-se as seguintes cifras anuais: R$ 300.655,60 do total de salários dos próprios deputados; R$ 288.694,80 de verba indenizatória; e R$ 568.206,60 dos cargos comissionados. O total por ano é de R$ 1.157.556,60.

Ao ingressar no Legislativo cada deputado dispõe, para livre nomeação nos gabinetes, de nove cargos comissionados. Em regra, eles têm direito a um motorista (R$ 1.194,21), um agente administrativo (R$ 1.393,20), um técnico em processamento de dados (R$ 3.959,23), um secretário de gabinete (R$ 5.927,50), um oficial de gabinete (R$ 5.927,46), dois assistentes políticos (R$ 5.879,02), um assessor parlamentar (R$ 6.774,21) e um chefe de Gabinete (R$ 6.774,35).

Contudo, há cerca de oito anos uma resolução interna deu aos parlamentares o direito de “dividir por três cada um dos cargos”. A partir daí, os gabinetes são ocupados por até 27 servidores em comissão. O valor de R$ 43.708,20/mês, no entanto, não foi alterado. Os salários passaram a ser divididos, somados, rateados ou empregados segundo a fórmula que possa ser acertada entre o deputado e os nomeados, desde que não ultrapassem o valor nominal para cada função e o total por gabinete.

A remuneração dos deputados está definida no artigo 47º do Regimento Interno da Assembleia Legislativa (AL), assim como a existência da verba indenizatória. Os cargos em comissão são disciplinados através de resolução interna da Mesa Diretora. Não é segredo, entre os funcionários dos gabinetes e o pessoal efetivo da Assembléia Legislativa, a existência de “gratificações” - algumas nos contracheques, outras oficiosas – que variam entre R$ 500,00 e R$ 1.500,00 distribuídas segundo o critério de cada deputado. Comprová-las? Só com a ajuda da direção da Assembléia.

A TRIBUNA DO NORTE enviou por três ocasiões uma serie de questionamentos à assessoria da AL sobre as regras salariais para os parlamentares, mas não obteve respostas. Entre outras questões, a reportagem perguntou se além dos itens de custos já citados aqui, os deputados têm outras formas de suplementação orçamentária para os gabinetes.

Quando questionados sobre os custos de cada parlamentar, deputados costumam encontrar explicações. Para o deputado José Dias (PMDB), o custo dos parlamentares do Rio Grande do Norte “é compreensível”. José Dias considera que os benefícios diretos são da população de todo o Estado e não dos deputados isoladamente. “Não somos nós. É o Rio Grande do Norte”. Ele argumenta que o condenável está na “distorção, malversação ou jogo extremamente vergonhoso”.

O deputado Fernando Mineiro (PT), ressaltou que um dos benefícios disponíveis, a chamada verba indenizatória, não pode ser contabilizada como sendo uma remuneração dos parlamentares, entretanto é aceito que despesas pessoais como hospedagem, alimentação componham os gastos pelos quais os deputados podem pedir ressarcimento. Despesas indiretas e mais subjetivas, como gastos com pesquisas e consultorias, também são aceitas.

Somar e dividir as despesas com salários parlamentares, com ajudas de custos e com cargos comissionados pelas 24 vagas de deputados existentes no Legislativo potiguar também é considerado “injusto”. “Nós estamos aqui representando o povo, somos advogados do povo, então essa divisão deveria ser feita comparando-se a população do Estado e não o número de deputados”, acrescenta o líder do PMDB, José Dias.