sexta-feira, dezembro 26, 2008

Dinheiro na mão é vendaval...

O dinheiro do natalense e o apetite de Gilmar
Jornal de Hoje, coluna Hoje na Economia, colunista: Marcos Aurélio de Sá, Natal, sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Não é um fato comum no mundo jurídico, em absoluto, um magistrado atender apressadamente pedidos de liminares que impliquem na liberação temerária de recursos financeiros "sub judice", especialmente quando se trata de dinheiro vivo.
Mandam a prudência e o bom-senso (e bom-senso deve sempre se sobrepor a quaisquer outros critérios — especialmente os de ordem política — suscetíveis de influenciar as decisões provisórias de um juiz) que nunca se facilite a prévia entrega do dinheiro em litígio para uma das partes litigantes.
As razões para isso são mais do que compreensíveis. E se, no julgamento do mérito, a parte favorecida pela liminar não tiver confirmado seu direito? E se, nessa ocasião, ela já houver dado fim ao dinheiro precipitadamente colocado em suas mãos, quem irá fazê-lo chegar à parte vencedora da lide?...

Dinheiro na mão é vendaval...


Gilmar e os julgamentos monocráticos...
Por estranho que possa parecer, no Brasil temos na presidência da suprema corte de justiça um ministro que está se tornando contumaz em atropelar a prudência e o bom-senso quando instado a apreciar causas de cunho político, fazendo aqui e ali julgamentos monocráticos que, no mínimo, fogem do padrão vislumbrado pela ética da maioria dos seus pares e da sociedade esclarecida.

Dinheiro na mão é vendaval...


O banqueiro prestigiado por Gilmar

Foi o que aconteceu, por exemplo, quando da repetida decretação de prisão preventiva do banqueiro Daniel Dantas (Foto), flagrado meses atrás pela "operação satiagraha" Polícia Federal praticando continuados atos de corrupção e de fraudes que afetavam o sistema financeiro do país e causavam pesados prejuízos ao erário. O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, simplesmente mandou liberar o bandido por duas vezes em menos de 48 horas, através de decisões polêmicas, até hoje colocadas em dúvida pelos meios jurídicos nacionais.
Nestes derradeiros dias de 2008, eis que novamente o ministro Gilmar Mendes vira protagonista de outra decisão estranhável, desta feita afetando os interesses na população e da classe política do Estado do Rio Grande do Norte.

Dinheiro na mão é vendaval...


No final de novembro último, faltando pouco mais de um mês para encerrar seu mandato, o prefeito de Natal, Carlos Eduardo Alves (Foto), decidiu "sponte sua" desvincular da Caixa Econômica Federal S/A a conta única da Prefeitura, mediante um distrato sem justa causa e, ao mesmo tempo, "vender" a administração dessa conta ao Banco do Brasil S/A durante o prazo de 60 meses, pela importância de R$ 40 milhões, valor este estipulado de forma aleatória, sem critério técnico, sem concorrência pública, sem oitiva e nem autorização do Poder Legislativo municipal.
O distrato injustificado com a CEF resultou, para a Prefeitura, no ônus do pagamento de uma multa contratual superior a R$ 9 milhões, já paga ou a ser paga (não se sabe ao certo, pois muito do que está acontecendo no âmbito da administração municipal é mantido ilegalmente fora do alcance da imprensa e do conhecimento dos cidadãos) por decisão pessoal do prefeito.
Concretizada a operação de "venda" da conta única ao Banco do Brasil, pontuada de possíveis irregularidades insanáveis, fato divulgado única e exclusivamente por O Jornal de Hoje e pelo JH Primeira Edição e estranhamente silenciado pelos demais diários natalenses, a Câmara de Vereadores começou a questionar o fato, até que foi colocado em votação e aprovado um decreto legislativo anulando a transação. (Foto: D'Luca/DN)

Dinheiro na mão é vendaval...




Nessa altura, os diretores do Banco do Brasil, sabedores da repercussão negativa do negócio mal explicado e temendo a perda do dinheiro a ser desembolsado, optaram sabiamente por depositar em juízo os R$ 40 milhões, até que o judiciário decida em múltima instância se a "venda" tem valor legal ou se o decreto legislativo é quem prevalece.
Uma ação popular também foi intentada para evitar que o judiciário permitisse a liberação do dinheiro no apagar das luzes da atual gestão. Seus autores alegavam que a administração municipal sequer possuía um plano de aplicação aprovado pela Câmara para utilizar tais recursos, o que se caracterizaria num ilícito.
Em primeira instância, o juiz Luiz Alberto Dantas considerou liminarmente regular a forma como a conta única da Prefeitura foi negociada, mas negou-se a liberar o dinheiro depositado em juízo até que se conclua o julgamento do mérito da ação popular.
Insatisfeito com a decisão e desesperado pela pressão dos credores da undécima hora, o prefeito Carlos Eduardo Alves apelou ao presidente do Tribunal de Justiça do Estado, desembargador Oswaldo Cruz, para que fosse reformada a decisão do juiz. Consta que o magistrado, se sentindo pressionado politicamente, alegou suspeição, indo o processo cair, por substituição, nas mãos da implacável e inabordável desembargadora Judith Nunes, que manteve a decisão de primeira instância.

Dinheiro na mão é vendaval...


Gilmar desbloqueia o dinheiro...
Já às vésperas do Natal, faltando apenas cinco dias úteis para terminar o ano, o prefeito passou a alegar que sem os R$ 40 milhões não teria como pagar o mês de dezembro ao funcionalismo, nem o grande volume de dívidas pendentes junto às empresas que prestam serviços à Prefeitura. E, assim, recorreu aos seus primos, senador Garibaldi Filho (presidente do Senado) e deputado Henrique Alves (líder do PMDB na Câmara Federal), bem como ao potiguar Suerdenberg Barbosa (assessor direto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva), para que eles usassem do prestígio político junto ao presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, no sentido de conseguir reformular, com urgência urgentíssima, a decisão da desembargadora.
Ouvido o Procurador Geral da República, que em questão de horas deu parecer favorável ao pleito, o presidente do STF suspendeu o bloqueio do dinheiro e determinou que o Banco do Brasil o depositasse imediatamente na conta do município, o que já deve ter acontecido na manhã de hoje, para alívio de quem tem contas a receber no apagar das luzes dessa desastrada administração.

Dinheiro na mão é vendaval...



Ministro Papai Noel
Resta saber o seguinte: se no julgamento do mérito o contrato entre a Prefeitura e o BB vier a ser considerado irregular e o decreto legislativo anulando o contrato for considerado válido; e se ficar caracterizada a aplicação ilegal desses R$ 40 milhões por falta de sua inclusão no orçamento geral do município, quem reporá o dinheiro que o ministro Gilmar Mendes, qual um providencial Papai Noel, mandou botar na mão do mau gestor?..."
Jornal de Hoje, coluna Hoje na Economia, colunista: Marcos Aurélio de Sá, Natal, sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Foto: Fábio Cortez/DN.