domingo, novembro 26, 2006

Rádios comunitárias e processo legal

As rádios comunitárias conforme
o Devido Processo Legal

Não tenho dúvidas, portanto, de que a competência para legislar sobre rádios comunitárias pertence basicamente aos Municípios, só podendo a União estabelecer regras gerais, necessárias diante de interesses nacionais reais. A autorização para funcionamento, dessarte, desloca-se para o Município, que a concederá mediante licitação pública. Minha convicção, nesse particular, é tão forte, que elaborei um modelo de anteprojeto de lei municipal, regulamentando o funcionamento das rádios comunitárias no Município, o qual está sendo adotado por inúmeras Câmaras Municipais.
3. Abuso de autoridade nas lacrações e apreensões feitas pela Anatel: A despeito de o Supremo Tribunal Federal ter decidido, por maioria de votos, a nível de liminar (ADIn nº 1668-5/DF), suspender a execução e a aplicabilidade do inc. XV do art. 19 da Lei nº 9.472/97, que autorizava a Anatel a realizar busca e apreensão de bens no âmbito de sua competência, esse órgão teima em não respeitar a decisão da maior Corte de Justiça do país e põe seus agentes em campo, gastando o dinheiro público, para lacrar as rádios comunitárias. Logicamente, sua atuação é inconstitucional, ilegal e abusiva, bastando considerar o seguinte: a) o Supremo Tribunal Federal recusou-lhe o poder de polícia justamente porque a apreensão (no caso de lacração ocorre o mesmo: a retirada do bem da esfera da disponibilidade do titular) viola a cláusula do devido processo legal, ou seja, em virtude da aplicação de pena (apreensão, lacração), sem oportunizar-se a prévia defesa em regular procedimento administrativo, que deve começar pela simples autuação; b) a lei que rege especificamente as rádios comunitárias não prevê essa sanção, a ver pelo art. 21, parágrafo único, da Lei nº 9.612/98, em que só são mencionadas as penalidades de advertência, multa e, na reincidência, revogação da autorização. Aqui viola-se o princípio constitucional da legalidade, porque a autoridade está aplicando uma penalidade não prevista em lei: c) poder-se-ia dizer que a Anatel pratica o ato com base no famigerado art. 70 da Lei nº 4.117/62 (com a redação do Decreto-lei nº 236/67), que prevê a apreensão prévia dos equipamentos. Mas não há lógica no raciocínio por dois motivos básicos: trata-se de um dispositivo penal e não administrativo; logo, falece competência à Anatel para autoexecutá-lo - principalmente depois que o Supremo não lhe autorizou a apreensão administrativa -, podendo, quando muito, representar ao Ministério Público ou à polícia, mesmo assim somente depois de autuar a rádio comunitária e de lhe proporcionar o direito de defesa e de demonstrar, mediante perícia, que a rádio opera em potência superior à permitida na legislação federal, a qual, como se viu, também é inconstitucional. De modo que, quando a Anatel faz a lacração invocando o art. 70 da Lei nº 4.117/62, ela está extrapolando suas funções administrativas e incursionando pela área penal, que não é de sua competência, gastando o dinheiro do contribuinte. E ainda acontece o pior: a Anatel, sabendo que o Supremo Tribunal lhe retirou o poder de polícia para apreensão prévia dos equipamentos transmissores, tem procurado a Polícia Federal, que a acompanha na diligência, com funções meramente intimidatórias. Ou seja, se a pessoa não deixar lacrar, a polícia efetua a prisão por resistência, ou desacato. Mas, usualmente, a Polícia Federal não assina o termo de lacramento; d) finalmente, cabe ressaltar que o egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região tem decidido, reiteradamente, que "a instalação e utilização rudimentar dos serviços de telecomunicações não configura cime, mesmo à luz da Lei 4.117/62, em face do pouco potencial ofensivo ao bem jurídico tutelado, eis que a figura penal do art. 70, do Código Brasileiro de Telecomunicações, não abrange o serviço de radiodifusão comunitária, de baixa potência e cobertura restrita, regido exclusivamente pela Lei 9.612, de 19.02.98, em caráter unicamente administrativo" (MS nº 1998.01.00.407698-4/MG - Juiz Plauto Ribeiro; MS nº 1997.0l.00.043653-2/MG - 2ª Seção - Rel. Juiz Olindo Menezes). Logo, também a Polícia Federal está agindo abusivamente, à míngua de perícia prévia comprovando que a rádio não é de pequena potência, à vista do princípio da inocência, que informa o processo penal, ou seja, não é a pessoa que tem que provar a baixa potência, mas o Estado é que tem que ministrar as provas do crime, no caso, a alta potência, conceito técnico que extrapola as funções da polícia judiciária.

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