quarta-feira, julho 12, 2006

Justiça tarda e falha

Final
Fábio Comparato explica que os juízes de primeira instância são menos convencionais que os dos tribunais, porém são mais influenciados pelo ambiente local: "Nos conflitos de terras, por exemplo, o juiz de primeira instância é, em geral, menos livre de julgar contra os interesses dos grandes proprietários rurais do que os membros dos tribunais de apelação, ou dos tribunais superiores da União", diz. Já Portonova diz que a direita vê o direito como uma ciência "asséptica, imune a opiniões, posições e (até) interpretações criativas". Mas em que sentido pode haver uma interpretação criativa? Portonova explica que identifica alguns temas cruciais, como questões que envolvem os negros, homossexuais, mulheres, sem-terra, devedores de banco e meio ambiente. Como, então, uma visão a favor dos bancos ou contra negros é uma visão de direita? No caso dos bancos, ele diz que o temor de que as decisões judiciais possam causar a falência do sistema financeiro mostra, do ponto de vista político e, por trás de argumentos jurídicos a favor dos bancos, a idéia de que, "quanto melhor para os bancos, melhor para o Brasil".
No caso dos negros, a direita não admite as cotas ou reparações. "Um pensamento de direita preza muito mais a liberdade do que a igualdade. E daí que o juiz de direita não terá dificuldade de encontrar argumentos ditos jurídicos para julgar contra os interesses dos negros", diz Portonova. Os homossexuais também são presas do pensamento de direita: "O pensamento de juiz de direita fala que se trata de uma ‘opção’ e não consegue identificar um caso de duas pessoas que se amam e vivem uma relação de afeto: ‘Vocês fizeram livremente uma opção pela homossexualidade, logo devem arcar com as conseqüências’. Como, para juízes de direita, o sistema jurídico não abriga os interesses dos homossexuais, não se dá o direito de união estável e da adoção (por exemplo) que se dá aos heterossexuais."
A direita no Judiciário existe de fato e é camuflada dentro da própria instituição. Manifesta-se não só por teoria, mas por atitudes e decisões, não dando espaço para um direito vindo das lutas sociais, das ruas, das necessidades da maioria. "Se o Judiciário não mudar de dentro pra fora, terá que mudar de fora pra dentro. A sociedade brasileira vai impor isso a ele", finaliza Sergio Mazina. (Thiago Domenici é jornalista. Artigo publicado na Revista Caros Amigos nº 26, do mês de dezembro de 2005. E-mail: thiagodomenici@carosamigos.com.br). (Caderno de Encartes do Jornal de Natal de em 20.02.06)

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