quinta-feira, dezembro 06, 2007

Falves Silva e o relevo do Poema Processo

RP - Fale sobre a palavra.
Falves - A palavra é necessária no aprendizado do alfabeto. Para você saber se conduzir. Para você se situar no mundo de hoje. Mas a palavra não responde artisticamente. Não responde mais as necessidade, frente à tecnologia avançada. Por exemplo, o cinema, a televisão, os clipes e o celular, que você faz filmes hoje. Você pode fazer um filme hoje com o celular. Cada pessoa é um cineasta hoje. É só você saber conduzir, e ter um direcionamento. E aí já vem Marshall McLuhan: a aldeia global. Chegamos á aldeia global. Chegamos no século 21, à aldeia global. Agora, com essa aldeia global e o poder... Você já leu "O Admirável Mundo Novo"? Nós estamos no admirável mundo novo, dominados por um indivíduo. Por uma cadeia, um sistema. Onde você é um número. Hoje mesmo passou na televisão um camarada que foi dado como morto. Mas ele está vivo. O número superou o indivíduo. Ele está vivo, mas está "morto" para o sistema. E a burocracia que se faz em torno disso é que é o grande entrave da humanidade. Nós precisamos nos desburocratizar, e fazer com que a humanidade entenda que a visão. Por exemplo. Eu vejo sempre o seguinte: o ser humano, ele primeiro vê. Depois, começa a falar.
RP - Dentro do que você está falando, considere o seguinte: eu escrevo um livro, e aí ele não tem público leitor. Pela falta da educação e pela falta da grana para comprar. São dois bloqueios. Agora, com a poesia processo, vocês não utilizam exatamente a imagem?
Falves - É o seguinte: a contradição sempre existiu na humanidade. Então, essa contradição existe agora. Por exemplo: eu acho que o cinema e a televisão é muito mais democrático. Hoje, qualquer pessoa tem uma televisão, seja lá no Amazonas, assiste a novela das 6 e a novela das 8. Então, globalizam tudo. Ele vai compreender o que está rolando naquele sistema lá, mas também vai compreender o seguinte: Ana Maria Braga faz aquele coquetel todo dia de manhã, um verdadeiro bacanal de comida, enquanto uma comunidade está passando fome. Ela assiste na televisão, e diz: "Mas, porra, que negócio é esse?" E ele com fome, comendo rapadura, comendo farinha. Porque não vá pensar, se você for aqui pra Macaíba ainda tem gente que ainda come bredo, folha, pois não tem dinheiro pra comprar. Então, nessa civilização, a contradição entre a tecnologia e a liberdade do indivíduo. O ideal seria a liberdade do indivíduo. Vamos todos ser felizes. Aí seria o ideal. Mas essas contradições existem em toda parte do mundo. Enquanto folclorizam, o excesso de folclore. Eu estou falando isso, porque estive lendo uma matéria, sobre uma pessoa que fez uma tese agora, em São Paulo, e saiu há umas duas semanas atrás uma matéria. E ela tinha razão. Folclorizaram tanto. Glamorizar o folclore é glamorizar a pobreza. Você está enfatizando: não vamos ser o bumba-meu-boi.
RP - Está conservando...
Falves - É o conservador. O conservadorismo. Não há um avanço tecnológico. E é o que nós precisamos. É a tal coisa: o homem está fazendo piquenique na Lua, mas está comendo farinha e rapadura aqui em Macaíba. Sem saúde, sem educação. E é ele que paga o imposto. É preciso que o povo brasileiro entenda que ele é quem é o dono do país. E não um determinado governador, um determinado presidente.
RP - Como ficaram seus contatos? Como você mantém contato e articulação com os grupos da poesia concreta e do poema processo?
Falves - O problema é que, naquele momento, quando surgiu, em 67, havia ilhas isoladas. Mas, em toda parte do mundo existiam ilhas que estavam, eram focos de artistas que tinham o mesmo princípio. O princípio da visualidade. Da arte visual, que talvez tenha vindo com a fotografia e com o cinema. (Foto de Paulo Augusto: Falves Silva)

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