quinta-feira, janeiro 17, 2008

Eles contra nós

Fernando Canzian
Folha de S. Paulo, São Paulo, terça-feira, 15 de janeiro de 2008
"INFLAÇÃO de 4,4% e dentro da meta. PIB acima de 5%. Maiores lucros da história. Alta de 44% na Bolsa. Mais de 1,6 milhão de empregos formais. Investimentos recordes. Mais eficiência e competitividade. Chuva de dólares.
Edificado sobre um cenário externo ainda positivo e a partir dos cuidados do Banco Central, oásis de prudência na área pública, esse é o setor privado de 2007.
Um Lobão na porta do galinheiro da energia, temeridade para a economia. Falta de infra-estrutura.
Tentativa de ressuscitar a CPMF para não cortar míseros 3,5% do Orçamento. Para os gastos sem fim, mais imposto sobre o pobre que só pode comprar a crédito.
Abulia diante dos desafios estruturais: a Previdência, o caos tributário, os custos trabalhistas. Escárnio e mentiras frente aos problemas. Nepotismo, gastança e empreguismo em tribunais, estatais, ministérios, Estados, prefeituras, no Congresso. Em toda parte. Esse é o setor público.
Há algo muito errado no Brasil. Parte dele luta para se modernizar, corta na carne para se ajustar. Quer correr contra o tempo perdido.
A outra segue como um fardo parasita. No intramuros da politicagem e da estabilidade, apenas engorda assistindo à carnificina darwinista que é a regra do lado de fora, onde a conta é paga. Segue como piratas, velando pela âncora pesada que segura o navio que quer zarpar. Uma geração inteira hoje na faixa dos 40 nunca viu o país crescer. Não como agora.
Com tantas chances reais de se afastar para sempre de uma praia maldita infestada de inflação, desemprego e miséria. Mas os políticos e o setor público teimam em agarrar-se ao passado. Não se incomodam em colaborar.
Com exceções que não deveriam ser senão a regra, remam contra.
Chupins pançudos e alheios aos esforços de quem os alimenta à revelia, com impostos. Não há cidadão ou ente privado que agüente mais esse arranjo.
Deu. A campanha vitoriosa contra a CPMF e a queda da MP 232 em 2005, visando mais carga tributária, são os dois primeiros, mas agudos, sinais desse cansaço. Há muitos anos perdidos dizia-se: "Ou o Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil".
Embora o inseticida encontre-se dentro do próprio formigueiro, poucos servidores e homens públicos de bem fazem uso dele, mesmo já morrendo de vergonha pelo estado das coisas. Onde estão as denúncias dos quem vêem ou sabem dos desmandos? As novas idéias?
O que querem os políticos? O que mais quer o setor público? Um "neomaniqueísmo" -eles contra nós- derivado da perplexidade diante de tamanha indiferença?
Nada pior para o conjunto, para o país. Pena, pois já estamos quase lá."
FERNANDO CANZIAN é repórter especial.
Publicado na FSP, veja aqui. (Para assinantes da FSP.)

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