domingo, dezembro 28, 2014

A luta contra as oligarquias do Nordeste

Redação do Jornal O POVO, Fortaleza-CE

A experiência que vivemos entre os dias 08 e 12 de dezembro de 2014 em Fortaleza (CE) foi múltipla, nas emoções que a cidade nos provocou.
Apesar da cidade ser vizinha do nosso estado, ainda não conhecíamos a capital do Ceará. Sabíamos, de ouvir falar, que o pessoal de Mossoró, pela proximidade, visitava muito Fortaleza.
A nossa viagem tinha um cunho turístico, mas aproveitamos para levar os três livros que lançamos, João Eudes e eu, para tentar uma resenha nos jornais de lá. Os livros já haviam recebido boa acolhida em Natal, onde apresentam até hoje grande procura. Trata-se dos livros “A Botija – A Bolsa Família Alves – Por que o Rio Grande do Norte (e o Brasil) não pode crescer”, lançado no dia 15 de novembro do ano passado, para marcar e comemorar a data da Proclamação da República e o aniversário de dez anos do Programa Bolsa Família, do governo federal; “Esse dinheiro é seu. E você nem viu”, acerca de um mandado de segurança impetrado por cinco cidadãos potiguares para forçar a implantação do Orçamento Participativo em Natal; e “Meu Filho Meu Tesouro, Minha República dos Ovos de Ouro no Berço da Mafiocracia”, lançado em setembro de 2014, tendo em vista a candidatura dos filhotes dos oligarcas potiguares nas eleições de outubro. 
Como ficou patente, com o decorrer do tempo, o primeiro livro, assinado pelo jornalista Paulo Augusto e o produtor cultural João Eudes, transformou-se “no best-seller do Café São Luiz”, da rua Princesa Isabel, no centro de Natal, conforme uma nota assinada pelo colunista da coluna Cena Urbana, do Jornal de Hoje, de Natal, o jornalista Vicente Serejo, pelo fato do livro alcançar extensa publicidade apenas no processo “boca-a-boca”, já que não houve lançamento oficial, nem dele nem dos outros dois.
Com bastante divulgação dos livros em blogs de blogueiros potiguares e nos sites de vendas, como o da Livraria Saraiva e outros afins, achávamos que seríamos bem recebidos pela imprensa cearense e assim escolhemos dois dos principais jornais cearenses - O Povo e Diário do Nordeste -, que visitamos na quarta-feira dia 10 de dezembro. Os principais jornais do estado são: O Povo, Diário do Nordeste e O Estado. Sabíamos, graças ao site Donos da Mídia (http://donosdamidia.com.br/estado/23), que, no Ceará, há destaque, dentre os grupos de comunicação, para a Rede Jangadeiro, que possui 9 veículos de comunicação, sendo um de seus sócios o ex-governador do Ceará e hoje senador Tasso Jereissat, havendo, entre os 9 veículos, 7 emissoras de rádios FM. Outros grupos também tem um bom número de veículos, como o Grupo Cidade de Comunicação, Grupo O Povo e o Sistema Verdes Mares de Comunicação (Diário do Nordeste).
Na visita aos dois jornais, aos quais levamos, além de exemplares das três obras, cartazes de publicidade, procurávamos sempre uma entrevista com os superintendentes ou presidentes, sendo encaminhados infalivelmente, pelos recepcionistas, à Editoria de Cultura.
Na sede de O Povo, onde procuramos um encontro com a sua presidente, Luciana Duminiar, ou com a diretora executiva de Redação, Ana Naddaf, ou ainda com o diretor geral de Jornalismo, Arlen Medina Neri, fomos encaminhados para a editora de Cultura, jornalista Sílvia Bessa, a quem explicamos o gênero de literatura que transportávamos. Por sorte, encontrava-se na redação um dos editores de Política, o jovem jornalista Érico Firmo, que atendia uma ligação no seu celular.  Essa ligação, muito animada, com Firmo andando de um lado para outro da redação, durou cerca de 20 minutos, até que ela pôde explicar-lhe o motivo da nossa visita. O editor se dignou a nos atender e até mesmo nos ofereceu um assento. Como não levamos cartão de visita ou mesmo um release dos volumes apresentados, nos dispomos a nos apresentar e às obras, passando-lhe o essencial acerca de seus conteúdos. Não sem antes comunicar-lhe que trabalháramos no Jornal da Tarde, O Estadão, Folha de S. Paulo e Diário do Grande ABC, neste último como editor, passando em seguida a uma descrição acerca dos livros. Apresentados, assim, de chofre, com a colocação dos três volumes e dos cartazes à mesa, causamos-lhe um repentino embaraço, que ele não pôde conter, tendo em vista a importância dos temas que descortinávamos: descrição sobre os cinquenta anos da oligarquia que comanda a política potiguar (Alves); mandado de segurança acerca da implantação do Orçamento Participativo de Natal; e narrativa sobre a “corrida do ouro” às eleições de outubro pelos filhotes de políticos dos grupos hegemônicos no RN (Alves, Maia, Rosado). Aproveitamos para fazê-lo abrir o nosso blog Radar Potiguar, onde ele disporia de resenhas e comentários acerca dos livros. Informamos, ainda, que as obras poderiam ser adquiridas através de sites de vendas, como Saraiva, Walmart, Sebo do Messias, Desconteiro.
Fizemos-lhe ver que já encaminháramos exemplares para a presidência da OAB/Ceará, assim como para alguns parlamentares, como Paulo Facó, deputado do PTdoB-CE - Partido Trabalhista do Brasil, com assento na Assembléia Legislativa do Estado do Ceará, político “com vasta experiência no Legislativo Municipal, tendo exercido 04 mandatos como vereador de Fortaleza”, “um homem simples, sensível, bem intencionado. Um cidadão que conhece a cidade e tem por ela uma paixão entusiástica. Cumpre com transparência e responsabilidade a missão que o povo lhe deu. Entrega-se com empenho e devoção na defesa dos legítimos interesses do povo. (...) Sua alma é ampla e aberta como as praças de nossa terra. Seu coração, assim como o nosso mar, é belo de se ver e navegar. Sua vida é assim, sem mistério ou disfarces, desfraldada como uma bandeira, sugerindo esperanças e convidando-nos para acompanhá-lo. (...) amante da boa música, da comida caseira, das histórias de boca da noite e da cultura popular, este filho do povo é capaz de todas as ternuras e sujeito a todos os encantos. Sempre foi bom de briga. Combate a injustiça social, a educação negada, a saúde mal cuidada, as discriminações de toda ordem. Tem fé na vida, brilho, competência e determinação. Sonha com melhores dias, grandes venturas, equilíbrio ambiental e perfeita qualidade de vida para os seus contemporâneos e para as gerações que ainda virão”, qualidades que ele sublinha no seu seu site da ALCE (http://www.al.ce.gov.br/index.php/deputados/liderancas-partidarias/20-partidos/prb/128), além de ser sobrinho do escritor Rui Facó, advogado e “um dos mais intensos intelectuais brasileiros, atuando como jornalista e pesquisador focado nas causas sociais e militando nos bastidores do PCB”, nascido em 1913, em Beberibe, Ceará, e falecido no dia 15 de março de 1963, para quem, no ano passado, providenciou uma homenagem, entrando com um requerimento instituindo 2013 como o Ano Rui Facó, sendo igualmente naquele ano lançado, postumamente, sua obra de referência, o livro “Cangaceiros e Fanáticos” (http://www.ruifaco.com.br/).
Sobre as obras, relatamos o sucesso obtido, em especial, pela “A Botija - A Bolsa da Família Alves”, que teria contribuído, junto ao eleitor potiguar, para subtrair votos para a candidatura de Henrique Eduardo Alves a governador do RN, o que fez com que Robinson Faria ganhasse a eleição com apertada margem de votos.
Érico Firmo titubeou, falando com hesitação, acerca do período de férias a que teria direito, e que se avizinhava, razão porque iria encaminhar o material a outros editores de Política. Aproveitou para minimizar o valor das obras, mencionando ser o Rio Grande do Norte “um Estado pequeno”, e que as obras apenas a ele interessavam. Nesse momento, apresentamos como argumento o fato de termos, em nossas hostes políticas, e no âmbito da Família Alves, o ministro da Previdência Social (Garibaldi Alves Filho) e o próprio presidente da Câmara Federal (Henrique Eduardo Alves). E que além disso, a importância do trabalho se sobreleva no momento em que a própria região Nordeste, tradicional feudo coronelístico, é objeto de uma reviravolta política, assistindo à derrocada da dinastia Sarney, que controlou o mísero Estado do Maranhão por cinco décadas, com o afastamento da política do próprio ex-presidente e senador José Sarney e de sua filha, Roseana Sarney.
“Se o Maranhão pode mudar, então os oligarcas de toda parte podem ser coibidos neste país”, vale ressaltar, com base na declaração do advogado Rodrigo Lago, ativista por transparência, em matéria (“Declínio da família Sarney abre caminho para mudança no Brasil”), assinada pelo correspondente do The New York Times no Brasil, Simon Romero (http://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/the-new-york-times/2014/12/27/declinio-da-familia-sarney-abre-caminho-para-mudanca-no-brasil.htm).
Partilhamos-lhe a surpresa que, efetivamente, os livros causaram no Rio Grande do Norte, e da clássica pergunta eventualmente assacada: “os autores ainda estão vivos?” Ele assentiu, assinalando: “Se fosse aqui, seria diferente.”
Recordamos-lhe a mudança ocorrida na política da Bahia, após a morte do oligarca Antonio Carlos Magalhães, aproveitando para recordar-lhe o ocorrido no próprio Ceará.
Em 1991, a partir de um diagnóstico sobre as mudanças no cenário político mundial e brasileiro, e diante da necessidade de se discutir uma agenda estadual, foi criado, o Pacto de Cooperação, movimento de parceria entre empresários e governo com o objetivo de repensar e reestruturar a economia local. Sabe-se que “o Pacto teve uma abrangência inicial limitada ao setor público e empresários, mas ainda procura ampliar seu leque de apoio envolvendo centros de pesquisa, estudo e ensino, movimentos comunitários, trabalhadores e organismos nacionais e internacionais. Um desafio que, se for ultrapassado, produzirá um salto de qualidade em suas propostas”.
O professor e pesquisador César Barreira, da Universidade Federal do Ceará, no livro “Os pactos na cena política cearense: passado e presente”, traz à discussão “as mudanças políticas e econômicas que serviram de base para a construção de um novo ciclo de poder no Ceará”. Na obra, ventila elementos para compreender até que ponto foram rompidas as práticas políticas tradicionais, azeitadas pelos antigo coronéis, com a subida ao poder, na década de 80, dos “novos empresários”.
Na Introdução, ele já assinala, para informação dos editores de Política: “As fortes marcas oligárquicas dão uma singularidade à política cearense, colocando o estado como um caso paradigmático no contexto das práticas políticas. Os grupos oligárquicos - grupos coronelistas que dominaram  a cena política por quase um século - imprimiram mecanismos ao poder que deram contornos precisos a uma política baseada em relações clientelistas e fortemente calcada no princípio de dependência e paternalismo. Esta é uma opinião partilhada por Carone (Edgar, ‘A República Velha: instituições e classes sociais’) e Faoro (Raimundo, ‘Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro’), que consideram o Estado do Ceará um caso exemplar de poder oligárquico. Oliveira (Francisco de, ‘O PT dos empresários: anacronismo ou modernidade do Grupo Jereissati’) coloca o Ceará como um dos estados ‘mais encarniçadamente oligárquicos’ do Nordeste.”
O autor vai dissecar a política cearense, que viveu três grandes ciclos de poder. “No início do século, com as oligarquias dos Accioli, dos Rabelo e com o padre Cícero. Este é exemplificado por Pereira de Queiroz (Maria Isaura Pereira de Queiroz, ‘O mandonismo local na vida política brasileira e outros ensaios’) como um caso extremo de chefe político local. A partir da década de 60 surge o poder dos três coronéis, Virgílio Távora, Adauto Bezerra e César Cals. No final da década de 80 chega ao poder central do estado o grupo de empresários organizado em torno do Centro Industrial do Ceará (CIC)”. Teriam as práticas políticas - coronelistas -, fortemente marcadas por aspectos tradicionais, sido rompidas com a ascensão das elites empresariais locais?
Vejam os editores de Política o que aconteceu entre os dias 13 e 24 de outubro deste ano, quando “dezenas de protestos, atividades e debates aconteceram em todo o país em mais uma Semana Nacional pela Democratização da Comunicação, organizada por dezenas de entidades e pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Além da coleta de assinaturas para o Projeto de Lei de Iniciativa Popular da Mídia Democrática, a Semana deste ano, realizada durante o período eleitoral, foi marcada pelo tema do coronelismo eletrônico – ou seja, os políticos que controlam empresas de comunicação e emissoras concessionárias de rádio e TV.”
“No Rio Grande do Norte, um vídeo contra os coronéis da mídia foi gravado no dia 17 em frente à InterTV Cabugi (retransmissora da Globo), controlada pelo atual presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN). Militantes pela democratização da comunicação entregaram panfletos à população e também numa festa que a própria InterTV organizou na Praça da Árvore de Natal, ponto estratégico na zona sul da capital potiguar.
“Nesta semana, um estande pela democratização da comunicação foi montado na Semana de Ciência, Tecnologia e Cultura, que acontece dentro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. O coronel da mídia José Agripino, senador pelo DEM, mandou um capanga intimidar os militantes. O advogado do Democratas exigiu a retirada dos cartazes da campanha instalados no estande. “Depois de muita negociação, a universidade permitiu a permanência dos cartazes, mas exigiu que as informações pessoais dos digníssimos deputados fossem ocultadas. Eles só não disseram como teríamos que fazer isso”, conta Iano Flávio Maia, do Intervozes-RN. Os ativistas aproveitaram então para denunciar a censura que estavam sofrendo, e o estande passou a ser um dos mais movimentados da feira. (...)
“No Ceará, as atividades da Semana pela Democratização da Comunicação começaram no dia 16 em Fortaleza, com uma roda de conversa sobre a campanha Fora Coronéis da Mídia. A roda fez parte da Conversa de Quintal, no Diretório Acadêmico do curso de Comunicação da Universidade Federal do Ceará. No dia 17, os militantes se reuniram em frente à TV Cidade, que em janeiro protagonizou o triste episódio de veiculação do estupro de uma menina de 9 anos em sua programação. Cartazes contra o senador dono da mídia Tasso Jereissati (PSDB/CE) e o deputado fora da lei Eunício Oliveira (PMDC/CE) foram pregados nos postes em frente à TV Jangadeiro.”
Para saber mais sobre a campanha Fora Coronéis da Mídia, realizada pelo Intervozes, Enecos e Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, visite o site www.foracoroneisdamidia.com.br
Todas as fotos das ações realizadas durante a Semana Nacional pela Democratização da Comunicação estão disponíveis na página do facebook da campanha (http://intervozes.org.br/protestos-e-debates-contra-o-coronelismo-eletronico-marcam-semana-nacional-pela-democratizacao-da-comunicacao-2014/).
Nada demoveu o jovem editor. Impressionado, talvez, com o volume de informações contidos nos três livros, que lhe chegaram de súbito, pediu-nos os telefones e ficou de nos comunicar o que a Editoria de Política iria resolver. Nos despedimos, com cortesia, e saímos como entramos, puxando a nossa cachorrinha...
Na Redação do Diário do Nordeste, a cena se repetiu. Estivemos ali na parte da tarde do último dia 10, quando, efetivamente, a Editoria de Política se encontra a postos. Na recepção, contudo, nos encaminharam para a Editoria de Cultura, já que trazíamos “livros”. Fomos conduzidos para o editor de Cultura, Leonardo, ao qual desfiamos o mesmo rosário já visto em O Povo. Leonardo, que nos permitiu sentar-se, ouviu nosso relato e apreciou os volumes, assim como os cartazes. Abriu igualmente o blog Radar Potiguar. Mas concordou que o assunto seria da seara da Política, à qual me encaminhou, indicando-nos à editora Lorena. Antes, solicitou que deixássemos os exemplares, que lhes causaram viva curiosidade. Lorena, que se encontrava a poucos metros do rapaz, na Redação da Praça da Imprensa, s/n, paralisou seu trabalho, por instantes, enquanto nos ouvia, sem nos permitir sentar-se. De modo que nosso colóquio não se estendeu por mais tempo. Não quis ficar com os cartazes, mas conteve os livros, tomou nota de nossos telefones. Chegou a mencionar o interesse “restrito” em torno das obras, por se referirem a um estado “vizinho” - no que recebeu nossa explicação acerca da importância regional e também nacional das obras. Mas, ficamos conversados.
Dali, saímos para a XI Bienal do Livro, que transcorria no Centro de Eventos do Ceará. À coordenação, fizemos a doação de mais exemplares, informando-nos o atendente que seriam aceitos, sem qualquer registro, sendo devidamente conduzidos a bibliotecas da rede pública de ensino do Estado do Ceará.



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