quarta-feira, julho 12, 2006

Juíza em São Paulo, Kenarik Boujikian Felippe, membro da Associação Juízes pra a Democracia, explica que a Constituição de 1988 estabeleceu princípios, conteúdos e valores democráticos que dão ao Estado poder e instrumentos para propiciar acesso à educação, saúde, trabalho e terra. Estabelece, por exemplo, que a propriedade devera cumprir uma função social.
Rui Portonova exemplifica: "A função social da propriedade é lei. Aliás, é a lei maior que diz que a propriedade ou tem função ou sua proteção jurídica está sob risco. Contudo, prefere-se salientar o ‘sagrado direito de propriedade’, sem aprofundar qual a sua ‘função’, se ela é social ou particular. Com isso, é possível dizer que a verdadeira fonte do direito para essa forma de ver a coisa é a ideologia".
Em avaliação feita em 2003, a ONU classificou o Judiciário brasileiro de lento, com tendência ao nepotismo, machista e pouco acessível à população carente. O relatório aponto 22 recomendações para melhorar esse quadro, entre elas a maior participação de mulheres, negros e índios na Justiça. O trabalho apontou que 95 por cento dos casos de assassinatos de trabalhadores rurais no Pará, entre 1985 e 2001, ficaram sem ser esclarecidos. O episódio ONU não foi isolado. A revista The Economist também criticou, em artigo, o Judiciário brasileiro e recebeu uma enxurrada de vaias dos magistrados daqui. O texto afirmava que o Judiciário brasileiro era uma instituição "jurássica e disfuncional" e que os juízes pareciam "antiquados, inalcançáveis e impassíveis de prestar contas aos cidadãos a que servem".
Fábio Comparato aborda o tema do ponto de vista sociológico: "Quem disser, redondamente, que a Justiça brasileira é conservadora, ou não conservadora, estará fazendo um juízo muito geral e abstrato; logo, imprestável para os efeitos de uma análise sociológica. O que se pode dizer, sem medo de errar, é que o Judiciário reflete a mentalidade social brasileira no seu conjunto, mentalidade essa que também varia segundo as classes sociais e as regiões do país. Sem dúvida, os magistrados são, maciçamente, das classes médias, sendo praticamente impossível encontrar um juiz oriundo da classe mais rica ou do extrato mais pobre do país".
Para o responsável do site Consultor Jurídico, Márcio Chaer, a diferença mais importante também é a de classes. Explica: "Um juiz fazendeiro tem dificuldades de se colocar ao lado de um sem-terra. Uma juíza que tem problemas com sua empregada doméstica tende a se solidarizar com a patroa. O juiz que fica indignado de ver a imprensa dar tanta notícia contra o Judiciário vai se identificar fortemente com quem for à Justiça reclamar da imprensa. Não sei se isso se dá no plano da ideologia ou no campo dos interesses comuns."

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