Orçamento Participativo
de Natal vai
à Justiça
Paulo Augusto e João Eudes
O Estatuto da Cidade determina que as diretrizes da política urbana, a gestão democrática por meio da participação da população e de associações representantes dos vários segmentos da comunidade – observe-se bem – se faça valer desde a formulação, passando pela execução e acompanhamento de planos, programas, e projetos de desenvolvimento urbano, estando a população, portanto, viva e ativa dentro do Plano Diretor Participativo, assim como no Orçamento Participativo. (Foto)
Para modificar um mau
costume enraizado na política, em geral, no aspecto da dedicação aos assuntos
que tratam diretamente de temas atinentes aos interesses da população, em
especial quando se fala de recursos, materializados em dinheiro vivo, deu
entrada na Comarca de Natal, no início de novembro, um Mandado de Segurança que
tem como objetivo retirar o Orçamento Municipal dos dentes do prefeito, dos
vereadores e dos seus grupos de interesse, e permitir à população, em geral,
ter acesso aos mais de 2 bilhões de reais que estão apalavrados para o uso da
Cidade do Natal em 2014. O mandado visa, ainda, discutir e acompanhar a gestão
desse cômputo de estimativas durante todo a sua execução, com o arremate final
da prestação de contas. A população, em geral, e o munícipe, em particular,
verão que são muitas as novidades que advêm de uma atitude como esta.
O processo recebeu o
número 0808303-81.2013.8.20.0001, na Primeira Vara da Fazenda Pública, estando
a cargo do juiz de direito auxiliar Everton Amaral de Araújo, que, em seu
despacho, solicitou informações às autoridades indicadas coatoras (Prefeito e
Câmara de Vereadores) no prazo de dez (10) dias, além de solicitar ao
Ministério Público o acompanhamento desse feito jurídico.
Fica o leitor sabendo
que um Mandado de Segurança é um santo remédio para se enfrentar a arrogância,
prepotência e desprezo que nos são dirigidos quando, por ventura, precisamos de
algum serviço ou de sanar uma necessidade intransferível, quando é imperiosa a
atenção do poder público. Como quando precisamos de um calçamento, de
saneamento, de água nas torneiras, de tapar buracos, de instalação de lâmpadas
em postes apagados nas nossas ruas, de reparo de praças, de retirada de lixo,
enfim, seja de grande ou de pequena monta nossas aspirações com relação ao
administrador público. Só que, com a ação ajuizada, ele vai aparecer e dizer
por que não faz.
No caso do Orçamento
Municipal, desde sempre, a população, em geral, nunca teve acesso às pretensões
do gestor público, assim como através da Câmara Municipal, acerca do quê se
pretende fazer com a arrecadação dos tributos, retirados - através de 62
impostos, de toda ordem - de nossas bolsas, mesas, bocas e sonhos e
desaparecidos nos ralos estaduais e municipais. Basta dizer que são nada menos
que 15 impostos, entre estaduais e municipais, com que nos molestam os
administradores públicos, sem que prestem contas do que fazem com essa
arrecadação, e nos amolem com a ausência de serviços, o que inferioriza nossa
qualidade de vida na cidade.
Uma coisa que precisa
ser desmistificada, é a falácia da Prefeitura do Natal quando afirma, com
cavilações (mentiras, é melhor dizer na lata, ou, para ser elegante, usemos
“com sofismas” - argumento ou raciocínio do prefeito e seus assessores
concebidos com o objetivo de produzir a ilusão da verdade, que, embora simule
um acordo com as regras da lógica, apresenta, na realidade, uma estrutura
interna inconsistente, incorreta e deliberadamente enganosa)
O que o prefeito Carlos
Eduardo faz (e fez na administração anterior, 2002-2008) é reunir a claque
(paga com nossos tributos) de cabos eleitorais em cada Região Administrativa e,
com o apoio da Secretaria Municipal de Relações Interinstitucionais e
Governança Solidária (Serig) passar a perna no povo, dizendo que permitiu a
participação no Orçamento Municipal...
O que muda a partir de
agora, no sentido da população ter acesso aos cerca de 2 bilhões de reais que
compreendem o Orçamento Municipal de Natal para 2014, é que um grupo de
natalenses deu entrada na primeira semana de outubro, na Comarca de Natal, com
um Mandado de Segurança contra ato do prefeito constitucional da Cidade do
Natal/RN, Carlos Eduardo Alves, e do vereador presidente da Câmara Municipal da
Cidade do Natal/RN, Albert Dickson. O mandado de segurança leva as assinaturas
de Edilson Freire Maciel, Jorge Rui Almeida da Silva, Paulo Augusto da Silva,
João Eudes Gomes e Marcelo José Ribeiro, que se encontram amparados no artigo 5º,
LXIX da Carta Magna, e na Lei 12.016/09.
A aplicação destes instrumentos de gestão trazidos pelo Estatuto da Cidade
tem como objetivo a efetivação dos princípios constitucionais de participação popular ou gestão democrática da cidade. (Ilustração)
Na fundamentação da
ação, o advogado Ednaldo Pessoa de Araújo explicita ser “Natal uma cidade
mundialmente conhecida, que está incluída na rota do turismo internacional, e
foi escolhida para sediar os jogos da Copa do Mundo de 2014. Possui uma receita
tributária anual bilionária. Todavia, nas últimas décadas, em face das péssimas
atuações dos poderes públicos do município, que insiste em gerir a política
pública municipal na contramão, afrontando lei federal, e por tal sofre com o
crescimento desordenado de favelas (atualmente já são 96 catalogadas), além de
vários outros problemas de ordem social, que facilmente poderiam ser evitados,
caso fosse observado na íntegra pelos gestores, o que dispõe os
mandamentos do Estatuto da Cidade.
“A lei federal de nº
10.257 de 2001, mais comumente chamada de Estatuto da Cidade, foi criada para
regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal que tratam da
política de desenvolvimento urbano e da função social da propriedade. O
Estatuto da Cidade é uma tentativa de democratizar a gestão das cidades
brasileiras através de instrumentos de gestão, dentre os quais podemos destacar
o Plano Diretor, obrigatório para toda a cidade com mais de vinte mil
habitantes ou aglomerados urbanos. A aplicação destes instrumentos de gestão
trazidos pelo Estatuto da Cidade tem como objetivo a efetivação dos princípios
constitucionais de participação popular ou gestão democrática da cidade e da
garantia da função social da propriedade que se constitui na proposição de uma
nova interpretação para o princípio individualista do Código Civil, entre
outros princípios”, como diz Caroline Faria, do site do Senado
(http://www.senado.gov.br/senado/programas/estatutodacidade/perguntas.htm).
O advogado Ednaldo
Pessoa chama a atenção da autoridade para o fato de que a “Lei Orgânica do
Município de Natal foi promulgada em 03 de abril de 1990, muito antes da edição
do Estatuto da Cidade, que foi sancionado em julho de 2001. E mesmo havendo a
referida lei municipal já sofrido mais de 25 emendas, até então a norma mirim
ainda não foi ajustada pelo Poder Público Municipal aos ditames da lei federal
10.257/01, conforme bem revela a mensagem 051/2012, do Poder Executivo,
apresentando ao Legislativo o Projeto de Lei do Orçamento Geral do Município -
exercício 2013, que foi aprovado pelo Legislativo municipal sem que nenhuma
referência fosse feita ao Estatuto da Cidade, afrontando assim uma norma
superior.
“Na mesma esteira, é de
se notar que a referida mensagem não fez qualquer menção quanto à gestão
orçamentária participativa, no referido projeto de lei orçamentária, o que é
uma condição obrigatória para sua aprovação, conforme impõe o artigo 44, da Lei
10.257/01. De forma que, ao aprovar o projeto de lei orçamentária sem a estrita
obediência ao que reza o Estatuto da Cidade, as autoridades coatoras
caracterizam uma ilegalidade que persiste até a presente data.
“Não bastando a patente
ilegalidade ora apontada” - prossegue o advogado Ednaldo -, “os impetrantes têm
conhecimento de que o novo plano plurianual 2014/ 2016, e o projeto de lei
orçamentária para o exercício de 2014 da atual gestão municipal encontra-se em
fase final de elaboração, e com previsão de remessa à Câmara Municipal ainda no
corrente ano. Entretanto, nenhum debate, audiência ou consulta pública foram
realizados pelo Sr. prefeito municipal com a população, a fim de discutir a gestão
orçamentária participativa, conforme encartado no Estatuto da Cidade.
“Conforme já afirmado,
o Estatuto da Cidade impõe ao Poder Público a participação da população na
elaboração da política orçamentária e gestão dos recursos públicos, de forma
que os impetrantes enquanto cidadãos natalenses têm o direito líquido e certo
de participar e opinar na elaboração da política orçamentária, gestão e
aplicação dos recursos do município de Natal/RN, bastando para tanto que as
autoridades coatoras cumpram o que determina a lei federal, promovendo debates,
audiências e consultas públicas, antes mesmo que qualquer lei municipal venha a
ser editada neste sentido.
“Pelos argumentos ora
apresentados, é de se notar que a matéria em discussão trata de direito difuso,
onde toda uma coletividade encontra-se ultrajada em seu direito, inclusive os
impetrantes, motivo pelo qual tem-se como abusivo e ilegal o ato praticado
pelas autoridades coatoras, o que oportuno e legítimo torna-se a impetração do
presente mandamus junto a este Juízo de Direito, para fazer cessar o ato
atacado e assegurar aos impetrantes o direito ora perseguido, pelo que requer o
seguinte:
A primeira plenária do Orçamento Participativo (OP) de São Bernardo do Campo (SP) foi realizada na Escola Municipal de Educação Básica (EMEB) Arlindo Miguel Teixeira, reunindo mais de mil pessoas e, destas, 650 foram credenciadas com poder de voto. (Foto)
“Sejam notificadas as
autoridades coatoras nos endereços supra fornecidos, para que prestem as
informações sobre o ora alegado;
“Seja concedida a
pleiteada segurança, para determinar ao Sr. prefeito municipal de Natal, que em
prazo a ser fixado por este juízo, apresente projeto de lei que ajuste a
política orçamentária do município de Natal, RN, aos ditames da lei 10.257/2001,
oportunizando à população a gestão democrática orçamentária participativa;
“Seja determinado ao
sr. prefeito municipal que se abstenha de enviar para apreciação do Legislativo
Municipal qualquer projeto de lei orçamentária em que não tenha havido a comprovada
participação popular na sua elaboração;
“Seja, afinal,
determinado ao sr. vereador presidente da Câmara Municipal de Natal, RN, que se
abstenha de receber e colocar em pauta para votação qualquer projeto de
política orçamentária em que não tenha havido a comprovada participação
popular, conforme disposto na Lei 10.257/2001.
“Por fim, em face do
presente mandamus tratar de interesse difuso, seja intimado o ilustre
representante ministerial (Ministério Público) para acompanhamento do feito até
final decisão judicial.”
Pelo que se sabe,
através do site do PSTU, a vereadora Amanda Gurgel havia apresentado uma emenda
que estabelecia o percentual de apenas 10% do valor total do Orçamento (2
bilhões de reais) “para o Orçamento Participativo, contra 1% defendido pela
Prefeitura”, numa discussão abstrusa que foge ao que estabelece o Estatuto da
Cidade.
O site do PSTU tenta
explicar o inexplicável. Veja que a emenda se encontra totalmente errada: “O
orçamento participativo é aquela fatia do orçamento em que a população pode
opinar sobre o destino de um percentual dos recursos públicos. A professora
Amanda Gurgel defendeu que fosse 10%(!?!), mas a Câmara decidiu que seria
apenas 1%(!?!!!). O ideal é que a população possa decidir sobre 100% do
orçamento. Começamos propondo 10%, mas nem mesmo isso a Câmara aceitou.”
Discussão completamente
confusa e inconsequente. Esperemos que o senhor prefeito chame a cidade para
discutir a totalidade do Orçamento Participativo.
O que falta ser
discutido pela população e principalmente dentro da Câmara Municipal do Natal é
o aproveitamento dos recursos que são destinados no orçamento para este ente
político, sem que a cidade tenha qualquer retorno.
Basta que a população
saiba que o Orçamento Participativo deverá sair dos dentes e das mãos do
prefeito e dos vereadores para ser discutido por 1.800 delegados. Delegados que
serão constituídos em cada bairro da cidade, na pessoa de seus moradores. E que
para ser delegado não precisa vestir terno ou gravata ou ter um MBA ou o escambau.
Desde 2001, data da lei do Estatuto da Cidade que o Orçamento era para ser
mexido por todo e qualquer habitante de Natal, que tem direito líquido e certo
a dar o seu pitaco. Não precisa de arrogância e empáfia. O negócio é no gogó e
no interesse dos mortais moradores de cada bairro. Isto já ocorre em diversos
pontos do Brasil.
Precisa vir a público
para discussão o valor que a cidade paga para que a Câmara Municipal funcione,
e até o momento não nos tenha respeitado a nós, os munícipes/contribuintes (Ilustração)
Com
os valores que nós pagamos a cada vereador, em torno de 50 milhões de reais por
ano, sendo 200 milhões de reais o que eles recebem a cada mandato de quatro
anos, daria para se construir, entre outros equipamentos necessários à cidade,
40 UPAS, 10 hospitais equipados a 20 milhões cada, e uma infinidade de creches
e escolas para a comunidade...
Com o Mandado de Segurança, os
impetrantes procuram dar uma chave de roda, arrochando os parafusos dos poderes
frouxos da República em Natal. Percebe-se que, com o tempo, os políticos
levaram os poderes à depravação e à desmoralização de uma teoria muito cara à
democracia, de autoria de Montesquieu (1689-1755), que escreveu, entre outras, a obra-prima literária "O
Espírito das Leis". Conhecido como Charles Montesquieu,
ou barão de Montesquieu, o filósofo, cientista político e escritor francês Charles-Louis Secondat nasceu em 18 de Janeiro de 1689 em La Brède, na
França, e foi um dos grandes precursores do pensamento iluminista.
“Nesta obra, Montesquieu fez um
apanhado das teorias políticas analisadas em suas viagens pela Europa e definiu
três tipos de governos existentes: o monárquico, onde a população servia a um
rei através de leis positivas; o republicano, regido na mão de várias pessoas
guiadas pela virtude; e o despótico, onde o autoritarismo de um líder podia
comprometer os direitos humanos através da política do medo. Montesquieu
formulou os princípios básicos para que governos tirânicos fossem evitados.
Para isso, defendeu a separação da máquina política em três poderes:
“Executivo: ficaria
responsável pela administração pública de uma nação, geralmente exercido por um
rei (Monarquia) ou chefe de Estado (República);
“Legislativo: ficaria
responsável pelos projetos de leis e representaria a Câmara dos Parlamentares;
“Judiciário: ficaria
responsável pelo órgão jurídico e pelo cumprimento das leis dos cidadãos e dos
outros dois poderes, exercidos pelos juízes e magistrados.
“Sua
teoria teve grande impacto no iluminismo europeu e serviu de molde para a organização do sistema político das nações
modernas. Apesar da grande visibilidade intelectual, Montesquieu sofreu duras
críticas de alguns setores e sua obra foi proibida de ser distribuída em
território francês após ser colocada no índice do Index Librorum Prohibitorum, da Igreja Católica. Mesmo assim, ainda conseguiu
publicá-la oficialmente em 1748 em Gênebra, Suíça, dividida em dois volumes.”
(Conf. O site: http://www.infoescola.com/biografias/charles-montesquieu/.)
O que vem ocorrendo é
que o nosso prefeito, juntamente com a Câmara de Vereadores, se fazem de
doidos, e ignoram por completo a existência do Estatuto da Cidade, a Lei
10.257/01, que relaciona, entre as diretrizes da política urbana, a gestão
democrática por meio da participação da população e de associações representantes
dos vários segmentos da comunidade – observe-se bem – na formulação, execução e
acompanhamento de planos, programas, e projetos de desenvolvimento urbano,
estando a população, portanto, viva e ativa dentro do Plano Diretor
Participativo, assim como no Orçamento Participativo.
Vale repetir: o Estatuto da Cidade determina que o Orçamento Participativo se dê mediante a realização de debates, audiências e consultas públicas sobre as propostas do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento anual, como condição obrigatória para sua aprovação pela Câmara Municipal. (Ilustração)
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